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Notícias

16 de Novembro de 2017

DOCUMENTO EM DESTAQUE – NOVEMBRO 2017

No âmbito do projeto “Documento em destaque 2017”, o Arquivo Distrital de Aveiro irá mensalmente durante todo o ano de 2017 destacar um documento que custodia nos seus acervos com a seguinte temática: “Empresas e Empresários das Indústrias Transformadoras na Sub-Região da Ria de Aveiro, 1864-1931”.

O documento em destaque no mês de Outubro de 2017 refere-se à “Confeitaria Mourão – Maria da Encarnação Mourão, Sucessores Limitada”, que foi constituída a 30 de janeiro de 1924, e que tinha por objeto a “exploração de antigo estabelecimento de comércio e fabrico de confeitaria, pastelaria e mercearia, sito na cidade de Aveiro na rua Coimbra e pertencente a Conceição Maria dos Anjos”, sob a razão social de “Maria da Encarnação Mourão, Sucessora”.

Na sociedade foram outorgantes:
Conceição Maria dos Anjos, solteira, comerciante;
Luciana Ribeiro de Castro e Ramos, casada, comerciante.

Esta sociedade tinha um capital de 10 mil escudos, com a seguinte distribuição: Conceição Maria dos Anjos, 5 mil escudos; Luciana Ribeiro de Castro e Ramos, 5 mil escudos. As duas sócias dividiam entre si, em partes iguais, o capital e as responsabilidades na “gerência”, ainda que a sócia Luciana ficasse “obrigada a permanecer e estar à testa do estabelecimento”. Estipularam igualmente que, “durante a vigência desta sociedade, nenhuma das interessadas ou os seus maridos poderão montar nesta cidade qualquer estabelecimento de confeitaria, ou pastelaria, não dizendo, porém, esta proibição, respeito à mercearia”.

A escritura da constituição da Sociedade “Confeitaria Mourão – Maria da Encarnação Mourão, Sucessores Limitada” pode ser consultada no livro de escrituras do notário de Adelino Augusto Simão da Fonseca, liv. 42, folhas 80 a 82v., livro este sob a custódia do Arquivo Distrital de Aveiro com o código de referência: PT/ADAVR/1CNAVR/001/0134.

Gracinda Pereira
Assistente Técnica/ADAVR
Fonte: Rodrigues, Manuel Ferreira, – Empresas e empresários das indústrias transformadoras, na sub-região da Ria de Aveiro, 1864-1931. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. 733 p. ISBN 978-972-31-1322-8

 


Conceição Maria dos Anjos

Georgino Rocha (Texto)

Conceição Maria dos Anjos, mais conhecida por D. Conceição da Costeira, nasce em Bolfiar, Águeda, onde vive uns anos, e reside em Aveiro, primeiro no asilo José Estêvão e, depois, com D. Maria da Encarnação Mourão, dona da casa dos ovos moles, de que vem a ser herdeira. A sua morte ocorre a 9 de Outubro de 1953.

Por experiência sabe valorar o desconforto dos abandonados pelos pais, dos órfãos em internato, dos serviçais empregados, dos sem outras posses, a não ser a vontade decidida de “agarrar” a vida e fazer dela um serviço à sociedade, à Igreja. Por educação abre-se à realidade envolvente, sobretudo nos anos 20 e 30 do século passado, e “dói-lhe” o coração ao ver os pobres e os infelizes, os doentes e os ignorantes, sobretudo das verdades cristãs, a escassez de clero e a deficiente preparação para ensinar os cristãos a situarem-se na complexa situação religiosa e social.

Um sonho toma forma

A ideia da diocese extinta previve na memória agradecida de alguns aveirenses e era acalentada, ainda que sem barulho público. D. António Mendes Belo confessa que incitaria os amigos de Aveiro a prosseguirem os seus esforços para a consecução do restabelecimento da Sé entre nós. Confissão feita em 1937, quando era Cardeal Patriarca de Lisboa, mas que havia sido Vigário Geral de Aveiro por delegação apostólica do Senhor Arcebispo de Braga, aquando da extinção a 1882.  A chama, ainda que trémula e mortiça, mantinha-se acesa. Outros cristãos, poucos, viam como boa a hipótese da reconstituição. É neste ambiente que Conceição Costeira começa a movimentar-se. A prática da caridade é o seu guia de acção e as necessidades dos outros, sobretudo dos pobres, marcam o ritmo do pulsar do seu coração e definem o seu campo de intervenção. Confiante, resiste a quem a contradiz e prossegue na divulgação mobilizadora do ideal que a galvaniza, após ter conhecimento do que afirma Rangel de Quadros sobre as razões da extinção. Ao seu conselheiro espiritual que tenta dissuadi-la várias vezes, contrapõe a sua convicção arreigada, teimosa, da necessidade da nova diocese. “Para a frente, que se a obra for de Deus, Ele a abençoará”, acaba por indicar Frei Inocêncio, franciscano, reitor do Seminário de Varatojo, a quem ela recorria em assuntos de consciência.

A primeira reunião

O ardor apostólico de D. Conceição leva-a a acelerar a concretização do gérmen do projecto idealizado. Fala no balcão enquanto avia os clientes de ovos-moles, apresenta o assunto na conferência vicentina da paróquia da Glória, escreve ao Núncio Apostólico em Lisboa com o auxílio da superiora do Colégio das Irmãs do Coração de Maria que traduzia as cartas para francês (língua oficial da diplomacia), convoca a 1ª reunião oficial que se realiza a cinco de Março de 1924. Estão presentes pessoas gradas da cidade, de que se destaca o pároco da freguesia da Glória, padre João Pinto Rachão e o Dr. Querubim do Vale Guimarães, Estas pessoas constituem o núcleo principal de irradiação luminosa que, em ondas crescentes, vai dando passos firmes e abrindo horizontes de confiança. Cria-se a comissão pro-restauração.

João Evangelista: de aliado a protagonista
A comissão preocupa-se com divulgar o projecto, ganhar a simpatia das pessoas, lançar pontes de mais-valia, granjear vontades de quem possa intervir junto das autoridades competentes. D. Conceição Costeira e outras pessoas, deparam-se, ocasionalmente, com o Arcebispo Lima Vidal em visita à cidade de Aveiro para homenagear a Princesa Santa Joana. A conversa é inconclusiva, apesar da forte insistência dos aveirenses que pretendiam que D. João Evangelista assumisse o sonho em realização. Virá a fazê-lo passados uns anos. Entretanto, impunha-se o silêncio de ponderação e a subtileza de actuação junto de quem podia influenciar o curso dos acontecimentos, o recurso a outros meios discretos, desde escrita sob pseudónimo até à conversa com amigos.

Alegria pelo sonho realizado

A comissão promotora da causa da restauração vai tendo sinais claros de que o processo está em boas mãos e se aproxima do fim. De facto, O Papa Pio XI assina a Bula «Omnium Ecclesiarum» a 24 de Agosto de 1938, bula que vem a ser executada a 11 de Dezembro do mesmo ano. D. João Evangelista é nomeado Administrador Apostólico e, como tal, encarregado de organizar a vida da nova diocese. A celebração litúrgica tem lugar na Igreja paroquial da Glória, agora Sé, sendo participada por uma assembleia exultante, na qual se integrava D. Conceição que, de joelhos e em atitude agradecida, ouvia a leitura do documento pontifício. “Gestos como este definem uma personalidade e demonstram o seu valor”, afirma João Gonçalves Gaspar, citando Joana de Magalhães, autora de um artigo sobre este assunto.

A notícia é celebrada jubilosamente. Com diversas intensidades e ritmos. Por aveirenses de nascimento e de coração. Duas pessoas terão vibrado de forma especial: D. João Evangelista e D. Conceição Costeira. Esta, “a protagonista popular da restauração” como a definiu D. Manuel de Almeida Trindade. Aquele, o hábil “homem do leme” que soube guiar a embarcação no rumo certo e fazê-la aportar ao cais da esperança, onde germinam as sementes da nova diocese.

A “doceira” de Aveiro, “de quem eu mais senti outrora os auxílios” na expressão de Lima Vidal, vê realizado o sonho da sua vida: Com a restauração surge o Seminário de Santa Joana para preparar sacerdotes; tem novo impulso a atenção aos pobres e às raparigas “mal-amadas”; são acolhidas pela Cáritas crianças vindas do centro da Europa devastada pela II Grande Guerra; ganham dinamismo apostólico os grupos e movimentos tendentes a dar rosto humano ao progresso crescente e a evangelizar a religiosidade do povo cristão.

Guiada pelo Espírito Santo

A têmpera anímica de D. Conceição, de que sempre deu provas, era alimentada por uma vida espiritual intensa. Mulher de oração frequente, vivia muito unida a Deus e ao Espírito Santo que, sem dúvida a conduzia, escreve no «Correio de Vouga» a Irmã Conceição Gomes, Missionária Reparadora do Sagrado Coração de Jesus, que, em menina, lhe havia sido confiada, em 1931. Nesta altura, informa, “já rezava e trabalhava por essa intenção”. “Fazia todos os anos duas ou três novenas de retiro na igreja da Glória, hoje Sé, na oração e no jejum. Saía de casa ao Angelus e voltava às Trindades; apenas lhe levavam uma pequena refeição ao meio-dia. À noite, tomava chá e um pão seco”.

Com a fortaleza de quem jejua, a confiança de quem reza, a audácia de quem sonha, o amor solícito de quem vive para os outros, a misericórdia manifesta o seu rosto irradiante e sedutor.

Fonte:

http://diocese-aveiro.pt/cultura/rosto-de-misericordia-d-conceicao-maria-dos-anjos/

Esta notícia foi publicada em 16 de Novembro de 2017 e foi arquivada em: ADAVR, Documento em destaque, Geral.